
A obra de Sigmund Freud está, nos últimos meses, sendo reeditada pela Companhia das Letras e L&PM com novas traduções, desta vez do alemão para o português. Isso não significa dizer que a clássica edição da Imago das "Obras Completas" ainda nao seja referência obrigatória para os estudiosos brasileiros. Lembremos que foi a partir dela, com todos os seus problemas e questionamentos, que se divulgou pela primeira vez em território nacional os escritos psicanalíticos e que, conseqüentemente, se fundou um vocabulário técnico, até hoje arraigado nas discussões teóricas que ambasam a prática psicoterápica. Ninguém questiona o papel que a edição da editora fluminense ocupou e ocupa na formação de grande parte dos psicanalistas e psicoterapeutas que atuam na área. O que se questiona é um pouco mais sutil: os termos adotados expressam de fato o que o pai da Psicanálise queria dizer?
As novas traduções arejam os textos a partir da releitura que pensadores contemporâneos oferecem ao público, com outros modos de compreender escritos freudianos consagrados. Tais traduções e reedições vem com o intuito de analisar os artigos exatamente como Freud os concebeu: na língua alemã e sem a influência da Escola Psicanalítica Inglesa, fortemente kleineana, que acabou atravessando a primeira versão da coleção, traduzida, na época, do inglês para o português por Jayme Salomão.
Em se tratando de Freud, fundador da mais importante ciência do início do século passado e cuja ressonância soou, inesperadamente, em outras disciplinas e campos de saber, tratam-se de edições ousadas e necessárias. A Psicanálise inaugurou um novo modo de compreender os fenômenos humanos, criando jargões técnicos muito particulares e nem sempre de fácil compreensão, mas que se popularizaram enormemente. Tenho certeza que você não se surpreenderia se encontrassse o porteiro do seu edifício chamando a moradora do 42 de "histérica" (espero, sinceramente, que a moradora do 42 não seja você). Com as novas edições, um amplo debate sobre o que o Velho queria dizer mesmo se estabelece quase que automaticamente. Nos projetos das duas editoras, muita gente interessante e com amplo conhecimento de causa enriquecendo a discussão. Ganhamos todos.
Ganhamos mais ainda no dia 15 de maio, às 17horas e 30minutos: a L&PM estará lançando dois volumes em grande estilo: "O mal-estar na civilização" e "O futuro de uma ilusão", versão pocket, serão precedidos de um um debate com o tradudor Renato Zwig, o professor Márcio Seligmann-Silva e os psicanalistas Edson Souza, Paulo Endo e Renata Udler Cromberg.
Tive a felicidade de ser aluna em uma disciplina de Psicopatologia de Renata Cromberg, uma das pensadoras mais interessantes que conheci e com quem tive o prazer de aprender. Cromberg é a responsável técnica e autora do prefácio da edição de "O futuro de uma ilusão", um dos chamados "textos sociais" em que Freud se questiona sobre o papel da religião.
Por isso, considero um privilégio este evento em plena Virada Cultural. Vou mais longe ainda e incentivo você, bravo leitor, a fugir da Virada Cultural (em sua essência muito chata e muito pouco cultural - ainda que amigos insistam em defendê-la dizendo que a chata sou eu) e ir assistir ao debate que - sei por fontes quentes - apresentará alguns pontos polêmicos que renderão boas discussões.
A melhor Virada (possível) para você.
E um bom debate para todos nós!